A Brotéria - Revista de Sciencias Naturaes, foi fundada em 1902, em Louriçal do Campo, no distrito de Castelo Branco em homenagem ao naturalista português Félix de Avelar Brotero. No número inaugural, foi esclarecido que a criação desta revista tinha como o objectivo divulgar as Ciências Naturais em Portugal:


A ideia de concorrermos, por pouco que seja, para propagar o gosto das ciências naturais em nossa pátria enche-nos de alegria. A natureza é um livro imenso, que tem ainda muitas folhas por abrir. Ora em todas elas se encontra escrito o nome augusto do Criador. E será acaso pequena satisfação ao abri-las mostrar nelas a grandeza de Deus, que tanto se estampa na imensidade do mundo, como na extrema pequenas, de miríades de animais e plantas, cuja existência só o microscópio nos revela?” (“Duas palavras de introducção”, Brotéria - Sciencias Naturaes I, pag. v)


Em 1907, a revista de ciências naturais dirigida pelo Padre Joaquim da Silva Tavares sofreu a primeira reestruturação, com o objectivo de abranger um maior número de leitores -  o carácter exclusivamente científico da Brotéria tinha resultado em poucas assinaturas em Portugal. A Brotéria – Ciências Naturais deu origem, então, a três séries distintas, Zoologia, Botânica e Vulgarização Científica. A série de Vulgarização Científica (SVC), contendo artigos em diversas áreas tais como física, química, fisiologia, microbiologia e arboricultura e abrangendo assuntos dirigidos a pessoas de cultura média foi toda escrita em português ao contrário das séries de Botânica e Zoologia, cujos artigos, de especialidade e originais, eram escritos nas línguas de escolha dos autores. Em 1911, a publicação da Brotéria foi suspensa após a expulsão dos jesuítas de Portugal, na sequência da queda da Monarquia e instauração da República. A edição da revista foi retomada em 1912, com artigos que já teriam sido previamente preparados, antes da expulsão da Companhia de Jesus e, em 1913, ressurgiu, no Brasil, com o subtítulo “Revista Luso-Brasileira”. Em 1925 deu-se uma das maiores mudanças editoriais na Brotéria com a alteração do subtítulo de  SVC para “Fé-Ciências-Letras” e com a introdução de novas secções dedicadas a assuntos religiosos, literários e humanistas.

A Brotéria - Revista de Sciencias Naturaes foi fundada em 1902 por Joaquim da Silva Tavares, Cândido Mendes e Carlos Zimmermann, professores no Colégio de São Fiel.Na Brotéria publicaram-se, no período de 100 anos, mais de 1300 artigos de investigação científica e foram descobertas mais de 2000 novas espécies, sub-espécies, géneros ou variantes nas áreas da Botânica e da Zoologia. Para além de artigos científicos originais, foram publicados diversos artigos de vulgarização científica, em áreas tão distintas como a Química, a Física, a Biologia e a Medicina. Em 2002 terminou a publicação da Brotéria-Genética e, a partir deste ano, apenas a vertente cultural da Brotéria continuou, com a designação de Brotéria - Cristianismo e Cultura.

Adaptado de Zimmermann SJ, Carlos (1906). "Microscopia vegetal." Brotéria, V, 229-244.

Brotéria - Ciências Naturais, 1964

Brotéria - Ciências Naturais, 1967

Adaptado de Rico SJ, Hermínio e Franco, José Eduardo (coord.), (2003). Fé, Ciência, Cultura - Brotéria 100 anos, Gradiva, Lisboa

As séries de especialidade científicas foram reunidas em 1932, pelo jesuíta suíço Afonso Luisier (1872–1957), recuperando a sua designação inicial de “Ciências Naturais”. Luisier, director da Brotéria entre 1932 e 1957 e especialista internacional em briologia, foi um dos fundadores da Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais. A publicação dos seus trabalhos sobre os musgos da Ilha da Madeira deu origem a uma das suas grandes obras Les Mousses de l’Archipel de Madère et en général dês Iles Atlantiques (1927–1945), completada com adições sucessivas em artigos posteriormente inseridos na Brotéria. O seu último artigo sobre musgos foi publicado em 1956, quando já contava com 84 anos. Ao longo da sua carreira científica descobriu 18 novas espécies e 13 novas variedades de musgos. No Instituto Nun’Alvres (Caldas da Saúde, Santo Tirso) conserva-se a sua excelente colecção de musgos divida em três secções Bryotheca Europaea, Bryotheca Atlantica e Bryotheca Exótica. Em 1933 foi nomeado sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa, e em 6 de Fevereiro de 1942 a Faculdade de Ciências do Porto, conferiu-lhe o grau de Doutor honoris causa em Ciências Naturais, por unanimidade. Em 6 de Fevereiro de 1957 recebeu as Insígnias do Oficialato da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada, pelas mãos do Subsecretário da Educação Nacional, Dr. Baltazar Rebelo de Sousa, que presidiu à sessão, levada a efeito no Teatro do Instituto Nun’Alvres (Caldas da Saúde), onde residia.

De 1962 a 1979, Luís Archer assegurou a direcção da Série de Ciências Naturais e, a partir de 1980, da Série Genética da Brotéria. Sob a sua direcção, surgiram os primeiros artigos de Genética Molecular em Portugal. Luís Archer (1926-2011) licenciou-se em Biologia (Porto, 1947), Fisologia (Braga, 1954) e Teologia (Frankfurt, 1960). Após conclusão da licenciatura em Teologia, foi enviado para os E.U.A. para estudar Genética Molecular, onde concluiu o Doutoramento em 1967 (Washington). Ao regressar a Portugal, introduziu o ensino e a investigação em Genética Molecular e criou e dirigiu o Laboratório de Genética Molecular do Instituto Gulbenkian de Ciência. Professor Catedrático de Genética Molecular (Universidade Nova de Lisboa) e fundador da Sociedade Portuguesa de Genética, Luís Archer publicou ao longo da sua carreira científica cerca de 250 trabalhos de investigação científica, filosofia das ciências e bioética. Em 1991 foi agraciado, pelo Presidente da República Portuguesa, com a Grã-Cruz da Ordem de Sant’Iago da Espada.

Joaquim da Silva Tavares nasceu em Cardigos em 1866. Entrou na Companhia de Jesus oficialmente em 1888 e foi professor nos Colégios de Campolide e de São Fiel. No Colégio de São Fiel assumiu diversos cargos tais como o de director do Herbário e do Museu de História Natural, e o de reitor, cargo para o qual foi nomeado em 1908. Com a Instauração da República e com as leis persecutórias de Afonso Costa foi exilado, primeiro em Salamanca e posteriormente no Brasil e na Galiza, na cidade de Pontevedra. A sua investigação em cecídias valeu-lhe em 1903 a nomeação para a Academia das Ciências de Lisboa, da qual se tornou sócio efectivo em 1928. Foi co-fundador da Sociedade Portuguesa e da Sociedade Ibérica de Ciências Naturais e pertenceu a diversas sociedades científicas europeias como a Academia de Ciências de Barcelona, a Sociedade Entomológica de França e a Pontificia Academia della Scienze Nuovi Lineei de Roma. Publicou 320 artigos na Brotéria, dos quais 75 na Brotéria Cultural.

Joaquim da Silva Tavares (1866-1931)

Cândido Azevedo Mendes (1874-1943)

Carlos Zimmermann

(1871-1950)

Cândido de Azevedo Mendes, também referido por vezes como Cândido Mendes de Azevedo, nasceu em Torres Novas em 1874 e ingressou no noviciado da Companhia de Jesus em 1888, no Barro (Torres Vedras). Foi professor de Física, Química e Ciências Naturais no Colégio de São Fiel entre 1896 e 1902. Foi ordenado em Roma em 1906, enquanto concluía os seus estudos em Teologia na Universidade Gregoriana. Foi um dos fundadores da Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais em 1907. Com a expulsão dos Jesuítas e das restantes Ordens Religiosas em 1910, as colecções do Colégio de São Fiel foram expropriadas. Cândido Mendes, exilado em Salamanca, tentou recuperar estas colecções,  escrevendo e divulgando     pela Comunidade Científica Portuguesa e Internacional O Collegio de S. Fiel. Resposta ao relatório do advogado Sr. Ramos Preto e A Brotéria no exílio.  Publicou 48 artigos na Brotéria Científica a maioria dos quais sobre Lepidópteros.

Carlos Zimmermann nasceu na Alemanha, em 1871 e entrou na Companhia de Jesus em Lyon. Sabe-se que saiu da Companhia de Jesus em 1921, enquanto estava exilado no Brasil. Foi Professor do Colégio de São Fiel, a partir de 1895, onde ensinou Física, Química, Música, Latim, História, Geografia e Alemão. Em 1907 foi destacado para o Colégio do Porto onde foi designado responsável do museu de Ciências Naturais que na altura se constituía. No ano lectivo de 1909-1910 esteve no Colégio de São Fiel, onde prosseguia a sua investigação em diatomáceas. Foi um dos co-fundadores da Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais juntamente com os seus colegas jesuítas Silva Tavares, Cândido Mendes, Camilo Torrend, Afonso Luisier e Manuel Rebimbas. A Sociedade de Ciências Naturais contou com 22 fundadores entre os quais Marck Athias, Miguel Bombarda, Gonçalo Sampaio e Corrêa de Barros. Publicou 29 artigos na Brotéria entre 1902 e 1919.

Bibliografia:

Francisco Malta Romeiras (2014), «Das Ciências Naturais à Genética: A divulgação científica na revista Brotéria (1902-2002) e o ensino científico da Companhia de Jesus nos séculos XIX e XX em Portugal», Tese de Doutoramento, Universidade de Lisboa, pp. 173-309.