A "Pascalina"

 

A possibilidade de mecanizar o cálculo aritmético foi apresentada pela primeira vez ao público em 1642 pelo matemático e filósofo francês Blaise Pascal. Pascal, então com dezanove anos e sem conhecimento dos trabalhos anteriores, construiu uma máquina calculadora que ficou conhecida pelo nome de Pascalina. Inventou-a com a finalidade de simplificar os intermináveis cálculos administrativos que efectuava com o ábaco de colunas para as contas do seu pai, então superintendente em Rouen.

A máquina de Pascal é a primeira máquina capaz de realizar as quatro operações fundamentais da aritmética e, cuja descrição completa e modelos autênticos ainda estão preservados. O primeiro modelo ficou pronto em 1642, tendo-lhe sido concedido o Privilégio (Patente) pelo Chancellor Seguier a 22 de Maio de 1649. A tradução de um texto de Pascal sobre a sua máquina que, em seguida, apresentamos, foi escrita por Pascal após o registo da sua invenção e foi encontrada postumamente na sua colectânea de trabalhos. A máquina aperfeiçoada, feita sob a sua direcção e dedicada a Seguier, é uma das relíquias mais interessantes de Pascal assim como é o primeiro modelo significativo no desenvolvimento de uma máquina de calcular.

A principal característica da Pascalina residia no transporte automático das somas, cujo princípio estava fundado num dispositivo mecânico composto por uma série de rodas dentadas, numeradas de 0 a 9, e ligadas de tal maneira que a rotação completa de uma delas faria avançar a seguinte em um dente.
Tratava-se essencialmente de uma máquina de adicionar munida de um mecanismo irreversível. Podia de igual modo executar subtracções graças a um engenhoso dispositivo pondo em jogo o método dos complementos aritméticos.

Segundo Pascal: “A máquina aritmética faz efeitos que se aproximam mais do pensamento do que o que fazem os animais; mas nada faz de que possa ser dito que tenha vontade, como os animais” (Pensées, 486). Sua irmã, Gilberte Pascal, acrescentava: ”Meu irmão inventou essa máquina aritmética que permite não somente fazer cálculos sem ajuda de fichas de nenhuma espécie mas de fazê-los sem conhecer nenhuma regra da aritmética e isto com uma segurança infalível. Este instrumento foi considerado como uma maravilha por ter reduzido ao nível de uma máquina uma ciência, que tem a sua fonte no espírito, encontrando o meio de realizar todas as operações com uma segurança absoluta sem necessidade de raciocínios”.

O instrumento pode ser classificado como uma máquina em dois níveis: o primeiro, a “transferência de dez”, normalmente designado o “transporte”, é realizado automaticamente; o segundo, uma instalação inicial é transmitida através de um meio de partes intermédias e finalmente registada nos mostradores de resultado. A concepção primária, de acordo com Pascal era conceber uma máquina que automaticamente produzisse o transporte. Uma roda dentada ou trinco, que tem a propriedade de mover o mostrador de ordem superior uma unidade para a frente enquanto que a tecla de ordem inferior passa de 9 para 0, é introduzida entre ordens sucessivas. O disco comum e teclas cilíndricas de hoje tiveram origem neste modelo. O maior problema na concepção duma máquina deste tipo é ajustar a carga do “transporte” para um mínimo de esforço dispendido na instalação inicial para levar o transporte tão longe quanto desejado. Esta situação acontece quando todas as teclas mostrarem 9 e for somado 1 na ordem inferior. A solução de Pascal daria crédito a um designer muito posterior. Uma alavanca calibrada é levantada gradualmente enquanto o número a ser instalado se aproxima do 9. Quando passa do 9 para o 0, a alavanca é libertada e, ao cair, encontra o 1 da ordem superior seguinte. Se todos os mostradores estiverem no nove, apenas sobra uma ligeira elevação para cada alavanca. Essa carga acumulada torna-se excessiva após muitas ordens, limitando deste modo a capacidade da máquina. A afirmação de Pascal de que 1000 peças poderiam ser movidas tão facilmente como uma falhou na prática.

Era um entusiasmo exagerado. A máquina apresentava alguns problemas de funcionamento que a levavam a cometer alguns erros. O seu órgão essencial, o saltador, engrenava muito mal nas barras da lanterna que era suposto governar e a transferência automática da soma, tão pouco era fiável, já que o mecanismo correspondente era bloqueado quando várias rodas indicavam simultaneamente o 9. A singularidade característica do design desta máquina que mais que qualquer outra revela o génio de Pascal é o uso de complementos de números na subtracção, permitindo realizar as quatro operações com uma única direcção de operação.

O sucesso de Pascal abriu caminho a novas pesquisas e um elevado número de inventores de vários países lançou-se na construção de adicionadoras mais eficazes. Podemos citar: o inglês Samuel Morland (1664); o italiano Tito Livio Buratini (1670); os franceses René Grillet de Roven (1678), De Lépine (1724-1725), Hillerin de Boistissandeau (1730); o alemão Christian Ludwig von Gersten (1735). Para mais informações sobre posteriores constructores de máquinas de calcular, consultar http://miami.int.gu.edu.au/dbs/1010/lectures/lecture4/Ifrah-pp121-133.html

Com Pascal foi pois inaugurada uma era caracterizada pelo impulso de construção de uma variedade considerável de máquinas capazes, não somente de aliviar o homem do pesado fardo do cálculo fastidioso e das operações repetitivas, mas de o substituir com toda a confiança na execução de uma categoria cada vez mais vasta de tarefas intelectuais com a possibilidade de nos servirmos delas sem precisar de as dominar, nem mesmo conhecer as leis matemáticas que regem o seu funcionamento.


Para melhor conhecer a Pascalina nada melhor que ler a tradução de um texto do próprio Pascal sobre a sua Pascalina.