Escola Única

Esta conferência foi realizada na sociedade de Estudos Pedagógicos em 10 de Abril de 1935.

O principal objectivo da Escola Única é debelar as diferenças económicas, sexuais, religiosas ou sociais entre as crianças.

 Nas palavras de Bento Caraça, na página 104 do seu livro “Conferências e outros escritos” :

“A animar este sistema escolar encontra-se, por consequência, o princípio de igualdade de todos perante a escola,...”

Os defensores da Escola Única têm, como um dos argumentos, o facto de o Estado ser responsável por promover um ensino que abranja todas as pessoas e que não favoreça alguns por serem mais ricos, de um meio social mais elevado.

Bento Caraça sempre defendeu que a cultura deveria ser para todos, que deveria ser um direito e não um privilégio. 

Assim, para construir a Escola Única, Bento Caraça apresenta quatro condições estritamente necessárias, a gratuidade, a coeducação, o laicismo,  e a selecção das capacidades.

  • A gratuidade refere-se, como o próprio nome indica, ao acesso gratuito ao ensino, não apenas no ensino primário mas também no ensino preparatório e secundário. Condição que pretende fazer com que o ensino, e também a cultura, não esteja dependente da condição económica, que possa estar ao alcance de todos. Um argumento a defender esta posição é que, deste modo, pessoas com grandes capacidades as possam desenvolver independentemente de serem ricos ou pobres.

No entanto esta condição é muito atacada pois muitos afirmam que, cito Bento Caraça (pág. 107), “o princípio da gratuidade é, afinal, impossível de aplicar, é mesmo injusto e imoral” apresentando inúmeros argumentos.

Bento Caraça aponta, de uma maneira muito frontal, o que está nas entrelinhas destes argumento, nada melhor do que ler esta passagem, na página 108 do livro “conferências e outros escritos”, no entanto tentaremos explicar de um modo sucinto essas “entrelinhas”.

O facto do ensino ser totalmente gratuito não só na escola primária, dizem os atacantes à Escola Única, implica que o número de pessoas formadas aumente e consequentemente agrave a crise neste sector.

Será justo, por esta razão, pessoas de meios sociais mais baixos perderem o direito à educação, à cultura e consequentemente o direito a uma vida melhor?

Outro argumento apresentado é o de, por o ensino ser gratuito, os pais perdem a liberdade de escolha sobre os filhos, ou seja, já não os mandam trabalhar tão facilmente, e assim a gratuidade é tida como uma medida de coacção sobre os pais.

Parece-nos um argumento de algum modo forçado, nas palavras de Bento Caraça “... na procura de motivos de justificação...”

Este princípio da gratuidade já em 1935 era tido como justo, no entanto não era aplicado. Para este facto só poderá haver uma justificação: a falta de vontade de o impor, uma vez que mais pessoas com cultura e uma educação superior parece constituir uma ameaça para a classe alta, com receio talvez da perda de poder na sociedade.

               

  • Outra das condições necessárias para instituir a Escola Única é a selecção das capacidades, que consiste em as pessoas ocuparem cargos de acordo com as suas capacidades e não de acordo com as suas condições sociais. Ou seja, uma pessoa, para ocupar um lugar de chefia ou de direcção tem que passar por um único teste, se tem capacidade ou não para isso. Não se verificando isto, as classes mais altas continuaram a ser as classes mais altas, e as classes mais baixas nunca terão a oportunidade de ter uma vida melhor! Assim, para esta condição poder funcionar plenamente, é necessário estender a escolaridade gratuita ao ensino secundário e superior, de modo a que que todos tenham acesso à educação e possam desenvolver e aproveitar as capacidades que tenham. Só assim o critério de selecção pode ser imparcial.

Muitos atacantes referem que é suficiente a gratuidade na instrução primária defendo-o até de uma maneira afincada. Mas, o facto de se preocuparem com a gratuidade no ensino primário, não será apenas porque isso lhes convém? Ou seja, o facto da população ter a instrução primária “valoriza a mão de obra e cria melhores a trabalhar...”, diz Bento Caraça na página 111 do seu livro.

  • As outras duas condições são um pouco mais complicadas para uma exposição breve como a presente, nem mesmo Bento Caraça se refere muito nomeadamente à coedução.

 

Olga Pombo opombo@fc.ul.pt