Leonardo matemático
A
visão estética da matemática de Leonardo da Vinci vai buscar as suas raízes
à geometria de Euclides e Platão que Leonardo estudou com afinco.
Desenhos de Leonardo que representam os sólidos platónicos. De notar que algumas destas representações têm faces transparentes de tal modo que permitem perceber a parte posterior do sólido através das faces anteriores
Quando, em 1509, Leonardo ilustra o livro Divina proportione de Luca Pacioli (1445 - 1517), o fascínio pela geometria foi tal que, consta, terá deixado de parte a pintura para só a retomar anos mais tarde.
É neste contexto estético que se deve entender uma das mais significativas contribuições de leonardo no campo da matemática. Referimo-nos ao belíssimo desenho conhecido por "Homem de Vitruvius". Ilustrando a velha tese de Protágoras (490 - 420 a.c.) segundo a qual "o homem é a medida de todas as coisas", Leonardo inscreve numa circunferência e num quadrado, um homem de braços e pernas estendidos, assim representando o cânone de proporções do corpo humano. O texto que acompanha o desenho transmite-nos a ideia muito concreta de que cada secção do corpo humano é uma medida (percentagem) do todo.
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Se observarmos atentamente o desenho, vemos a figura de um homem com os braços em cruz inscrita num quadrado, cujo centro é a pélvis. Esta figura é intersectada por várias linhas verticais e horizontais, que determinam a divisão do quadrado em 16 partes iguais. Sobreposta a esta está uma outra figura em que o homem tem os braços levantados e as pernas afastadas, inscrita num círculo, cujo centro é o umbigo, ponto de conjugação dos princípios masculino e feminino. Da interacção da forma do quadrado com a forma do círculo, nasce o pentágono (que contém em si o número de ouro). A largura do espaço compreendido entre os braços do homem é igual à sua altura. |
"Os 4 dedos fazem uma palma e 4 palmas fazem
1 pé, 6 palmas fazem um cúbito; 4 cúbitos fazem a altura de um homem. 4
cúbitos fazem um passo e 24 palmas fazem um homem. Se se abrir as pernas
até termos descido 1/14 de altura e abrirmos os braços até os dedos
estarem ao nível do topo da cabeça então o centro dos membros abertos será
no umbigo. O espaço entre as pernas abertas será um triângulo equilátero.
O comprimento dos braços abertos de um homem é igual à sua altura. Desde
as raízes dos cabelos até ao fundo do queixo é um décimo da altura do
homem; desde o fundo do queixo até ao topo da cabeça é um oitavo da altura
do homem; desde o topo do peito até ao topo da cabeça é um sexto da altura
do homem; desde o topo do peito até às raízes do cabelo é um sétimo da
altura do homem; desde os mamilos até ao topo da cabeça é um quarto da
altura do homem. A maior largura dos ombros contém em si própria a quarta
parte do homem. Desde o cotovelo até à ponta dos dedos é um quinto da
altura do homem e desde o cotovelo até ao ângulo da axila é um oitavo da
altura do homem. A mão inteira será um décimo da altura do homem. O início
dos órgãos genitais marca o centro do homem. O pé é um sétimo do homem. Da
sola do pé até debaixo do joelho é um quarto da altura do homem. Desde
debaixo do joelho até o início dos órgãos genitais é um quarto do homem. A
distância entre o fundo do queixo e o nariz e entre as raízes dos cabelos
e as sobrancelhas é a mesma e é, como a orelha, um terço da cara"
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Construção geométrica sobre O Homem de Vitrúvio (1490) |
"O que parece ter passado despercebido durante os mais de 500 anos deste famoso desenho é que o círculo e o quadrado, de área desigual, são completados por um novo círculo, respectivamente, em que as medidas das áreas passam a ser "iguais" em cada par círculo-quadrado. Quanto ao novo círculo é surpreendente perceber como o desenho já o induzia: os dedos médios dos braços horizontais definem este círculo, do mesmo modo que os dedos médios dos braços esticados para cima definem o círculo maior. É de realçar que a área do quadrado original mede aproximadamente 153.9cm² e a área do círculo associado mede 153.9cm². |
Repare-se que, na base do pescoço da figura humana, Leonardo marcou dois pontos unidos por um segmento. A recta que contém este segmento também contém os pontos de intersecção do quadrado original com o círculo menor. Mais do que isso, os pontos que Leonardo assinalou são precisamente os centros das rotações que transformam os braços horizontais nos braços levantados. São observações importantes, pois há razões
suficientes para crer que fazem parte do conceito do Homem de Vitrúvio."
(Reis, 2002, p.32) |
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Rascunho de uma calculadora de Leonardo Da Vinci
Modelo operacional de uma calculadora de Da Vinci
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Embora a invenção da primeira máquina calculadora mecânica tenha sido atribuída a Blaise Pascal (1623 - 1662), a verdade é que, 150 anos antes, Leonardo da Vinci já tinha trabalhado nessa área. De acordo com as indicações dos seus manuscritos para a construção de uma máquina de calcular, as somas seriam transportadas automaticamente a partir de um conjunto de rodas dentadas numeradas de 0 a 9, ligadas de tal maneira que uma volta completa de uma roda girava um dente da seguinte. A máquina seria capaz de fazer somas e subtracções com números que poderiam ter até 13 algarismos. |