HOME

Exames

O estudante pode-se apresentar a exame quando e quantas vezes o quiser, mediante a condição de ficar um ano à espera se ficar reprovado.
Se o chanceler se encontrava muito ocupado para receber o aluno ou quando havia muitos candidatos, os estudantes tinham permissão para procurarem outro examinador. recorriam aos padres, que eram geralmente muito requisitados, pois eram considerados mais indulgentes, ou então a um mestre menos competente.
Foi o Papa Honório III (1219) que introduziu regras específicas no modo como o ensino se processava. Os examinadores eram eleitos de modo que não conheciam o estudante candidato a exame. Era proibido oferecer-lhes o que quer que fosse, excepto uma caneca de cerveja. Eles tinham que jurar que não chumbariam ninguém por motivos de ódio, nem aprovariam outros por favor, mas que julgariam todos de acordo com a prova prestada e assiduidade às aulas.
Relativamente aos exames e obtenção dos graus, cada universidade tinha os seus costumes. Tomemos como exemplo dois curricula escolares tipo: o do jurista bolonhês e o do artista parisiense. O novo doutor bolonhês obtém o grau por duas etapas: o exame propriamente dito (examen ou examen privatum) e o exame público (conventus, conventus publicus, doctoratus) que era de facto uma cerimónia de investidura.
Algum tempo antes do exame privado o candidato era apresentado pelo consiliarius da sua nação ao reitor, a quem jurava primeiro ter assistido às aulas e que nunca infringira os regulamentos da universidade, comprovado pelo juramento de outras testemunhas. De seguida, o estudante declarava que não tinha dado nenhuma prenda ao examinador, ao chanceler ou aos mestres, na esperança de passar ao exame. Na semana que precedia o exame, um dos mestres apresentava-o ao arcediago e respondia pela sua capacidade para enfrentar a prova. Na manhã da mesma, após ouvir a missa do Espírito Santo, o candidato comparecia perante o colégio dos doutores e um deles entregava-lhe duas passagens para comentar. O candidato retirava-se para sua casa, onde preparava o comentário que apresentava à noite, num local público (quase sempre a catedral), perante um júri de doutores, na presença do arcediago que não podia intervir. Depois do comentário exigido, respondia ás perguntas dos doutores que seguidamente se retiravam e votavam. Obtida a decisão por maioria, o arcediago tornava o resultado público.
No dia do exame, o candidato dirigia-se ao local onde se encontravam os examinadores acompanhado pelas autoridades académicas.
Aprovado no exame, o candidato passava a licenciado, mas só depois da prova pública adquiria o título de doutor e podia, de facto, ensinar. O "laureando" percorria as ruas da cidade a anunciar a altos berros a prova a que ia-se submeter. Porém no dia do exame só podia ir acompanhado por 10 dos seus companheiros de estudo e por aqueles que habitavam na mesma casa que ele.
A assembleia que se reunia numa igreja era composta pelo bispo, os professores, os bacharéis, os parentes e amigos e ainda os indivíduos ligados à universidade: livreiros, pergaminheiros, encadernadores, iluministas, etc.

Nesse dia era conduzido com pompa até à catedral, onde fazia um discurso e lia uma tese sobre uma questão de direito, que defendia depois contra os estudantes que o atacavam, desempenhando assim, pela primeira vez, o papel de mestre numa disputa universitária. 
No fim das provas os examinadores declaravam: "Aprovo por que ele o merece" ou ainda "Aprovo, se bem que ele saiba apenas o suficiente". No caso do aluno ser reprovado, ele era informado discretamente do seu resultado. 
Terminado com êxito o exame, o novo doutor recebia de joelhos, das mãos de um dos assistentes que ele próprio designara, as insígnias do seu título: um anel de ouro, testemunho do seu casamento com a ciência; um barrete magistral, símbolo do respeito que de futuro lhe era devido; e um livro, que ora de abria ora se fechava. Fechado, significava que o saber devia ser encerrado dentro do espírito do novo doutor, a fim de não ser desvendado a pessoas indignas; aberto, simbolizava o seu dever de ensinar aos outros o que sabia. Era então abraçado pelos mestres e pelos colegas e aclamado pela sua nação. Por fim, recebia o abraço, a bênção e o beijo da paz do próprio reitor.

Em Mompilher, o candidato tirava à sorte, de manhã cedo, a questão que iria apresentar e debater nessa tarde. Em Paris, o discurso do candidato era composto por dois actos públicos: um propositum e a harenga. O primeiro consistia na apresentação da tese que se propunha defender, acompanhada das teses contrárias a esta. A harenga era um discurso a louvar a disciplina na qual ele se formou. Depois de invocar Jesus Cristo, o candidato comentava alguns textos e concluía dando acções de graças a Deus e à Virgem, ao seu santo Padroeiro e aos doutores presentes na sala. Tanto o propositum como a harenga eram lidos.
Ao jovem artista parisiense era imposto um grau preliminar. Só depois desse primeiro exame, a determinatio, o estudante se tornava bacharel. A determinatio era precedida por duas provas de acesso. Primeiro, o candidato devia sustentar um debate com um mestre durante as responsiones que tinham lugar no mês de Dezembro, antes da Quaresma, altura em que decorreria o exame. Se fosse bem sucedido na prova, era admitido ao exame detarminantium ou baccalariandorum, em que devia provar que satisfazia as prescrições dos estatutos e manifestar, pelas respostas às perguntas formuladas por um júri de mestres, que conhecia os autores inscritos no programa. Ultrapassada esta barreira, surgia a determinatio: durante a Quaresma dava uma série de aulas em que devia mostrar a sua capacidade para prosseguir a carreira universitária. Um representante do chanceler, designado de "paranymphus" (mensageiro do futuro noivo), revestido de uma capa escarlate e com um barrete de veludo, apresentava a "signeta", que era uma lista dos candidatos aprovados ao exame. A cerimónia realizava-se no dia anterior à entrega do diploma e estavam presentes o reitor, os bedéis, o bispo, os presidentes e conselheiros da universidade, os nobres e todas as personalidades importantes da cidade. A escolha do local era do licenciado e geralmente recaía no colégio mais prestigiado, que era então revestido de tapeçarias, recheado de baixelas de ouro e de prata e fornecido de vinhos e guloseimas.
O bacharel "admittantus" devia jurar respeitar os estatutos, as liberdades e privilégios da universidade e os seus segredos. Endossava a capa e podia sentar-se no meio dos outros bacharéis. Ficava encarregado de ensinar os mais novos. 
Segunda etapa: o exame propriamente dito que conduzia à licença para ensinar e ao doutoramento. Também aqui havia várias fases. A mais importante consistia numa série de comentários e de respostas a questões postas perante um júri formado por quatro mestres e presidido pelo chanceler ou pelo vice-chancheler. O candidato admitido recebia solenemente, alguns dias mais tarde, a licença para ensinar, das mãos do chanceler, durante uma cerimónia em que devia fazer uma conferência que não passava de uma formalidade. Só cerca de seis meses depois se tornava de facto doutor, no decurso da inceptio que correspondia ao coventus de Bolonha. Na véspera tomava parte numa discussão solene a que se chamava de vésperas. No dia da inceptio dava a lição inaugural perante toda a faculdade e recebia as insígnias do grau.

Topo

O preço elevado dos exames

Antes de se apresentar a exame, o futuro doutor devia pagar "taxas" ao arcediago, ao vigário, aos examinadores e ao seu promotor. A importância destas era conforme as universidades, os séculos e as faculdades, sempre mais elevada para o Direito canónico e mais baixa para a Medicina. Em Bolonha, no século XV, era necessário ter um rendimento de 80 libras para ser admitido ao doutoramento. Em Mompilher a quantia eleva-se a 10 escudos em ouro, além de uma pequena quantia para os bedéis e outras pessoas ligadas à universidade. Havia ainda a obrigação de oferecer aos dois bedéis um vestuário completo no valor de 20 soldos torneses cada um. Em Pádua, havia o costume de oferecer ao bispo, vigário e sacristão um barrete e um par de luvas de um determinado feitio, compridas de modo a chegarem a meio do braço, de camurça e que custem pelo menos 23 soldos cada par. A cada mestre do colégio, um barrete e um par de luvas de carneiro. Aos doutores das outras faculdades, aos bacharéis e aos estudantes de Teologia, um par de luvas normais. Aos familiares do bispo, 12 pares de luvas de 50 soldos; ao regente da faculdade, 20 ducados em ouro e mais outros 20 para ele comprar um fato. Além disso, para todos os indivíduos, cestas de frutas e especiarias, uma libra de compotas e "pastilhas de açúcar".
Em Paris, o novo doutor devia oferecer ao presidente do júri uma sotaina de seda roxa, um manto de púrpura, um par de botas com esporas de ouro e um barrete quadrado.
Foram vários os protestos contra o preço dos exames praticados pelas universidades, tendo merecido diversos avisos de alguns Papas ao longo do tempo e, algumas propostas de fixar os valores dos exames. Contudo, estes pedidos foram sempre ignorados.
Se o exame público era caro, aquilo que se seguia ainda mais caro custava. Era obrigatório seguir-se um banquete para qual todo o pessoal universitário era convidado. Conta-se que em Paris, o novo doutor e os seus companheiros seguiam, dançando, através das ruas e das praças da cidade, apostando quem conseguia beber mais canecas de vinho. Pagavam a tocadores de pífaros e tambores para animar a festa e a sineiros para anunciarem a boa noticia. Devido aos gastos exagerados nestas festas, foi decretado o valor limite que os novos doutores poderiam gastar, em várias universidades.

Topo

Olga Pombo opombo@fc.ul.pt